quarta-feira, 3 de julho de 2013

Gente como a gente...




"Ainda há gente que não sabe, quando se levanta, de onde virá a próxima refeição,
 e há crianças com fome que choram." Nelson Mandela


Quantas vezes passamos por uma calçada, uma praça, uma marquise, um viaduto... e encontramos um morador de rua indo e vindo, dormindo, sentado, jogado? Muitas vezes. Por que essas pessoas estão nas ruas? Você, que me lê agora, o que sentiu ao passar por uma dessas pessoas? Qual foi o seu primeiro pensamento?

São várias as razões que levam uma pessoa a viver e morar nas ruas. As mais apontadas são o alcoolismo, a drogadição, problemas psicológicos, desavenças familiares, desemprego e a falta de uma moradia convencional. Alguns dormem em albergues/abrigos, porque se sentem mais seguros... quando conseguem. Outros, preferem as ruas, a liberdade para o uso de drogas e álcool. Assim, todos os dias, calçadas se transformam em camas. Eles vivem sem endereço, sem rumo, sem esperanças, sem oportunidades. É triste a realidade da população em situação de rua. Muitas vidas. Muitas histórias. Muitos conflitos. Falta saúde. Falta tudo. Cerca de 79% dessas pessoas fazem uma (apenas uma) refeição todos os dias e 19% se alimentam em dias alternados. Poucos, trabalham informalmente, tendo rendimentos mínimos. Esses são dados que fazem parte de uma pesquisa realizada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.  

No maranhão, assim como em todo o país, é difícil estimar a quantidade exata das pessoas que vivem nas ruas, principalmente, porque essa população não está inclusa no censo demográfico do IBGE. O número é absurdo e muitos não conseguem se reinserir na sociedade. Socialmente invisível, essa gente passa a vida jogada à própria sorte, com os direitos básicos de cidadania negados. Além da vida que já levam, são, constantemente, vítimas da violência e ainda sofrem a higienização social. Ações de retiradas arbitrárias e involuntárias constituem a higienização social. A expulsão, o tratamento inadequado não passam de preconceito, medo e inércia dos que reclamam. A verdade é que, por trás da aparência, quase sempre, grosseira, marcada pelos maus tratos, há muita fragilidade. Para a sociedade, quem está na rua é bandido e não presta. Atravessam a rua, mudam de calçada, mas não querem passar perto. Esquecem que os bandidos mais perigosos estão por aí, vestidos com seus ternos caros (nada contra os ternos), lutando por qualquer coisa (menos pelo povo)... mas essa é outra história. Sabemos que é grande a violência nas ruas. Sob o efeito das drogas, álcool e fome, alguns moradores de rua cometem delitos, mas essa não é uma prática exclusiva deles. Há os que não fazem isso e nem usam drogas. Aqueles que praticam os maiores delitos nas ruas, não moram nelas, não dormem em becos escuros, sobre papelões ou sob as luzes dos postes. Na rua também há gente de bom caráter, gente precisando de ajuda... gente como a gente.

As ações das organizações não governamentais e Igrejas, são lindas e levam alimento para o corpo e a alma. Apesar dos esforços, é fundamental a implementação de ações mais firmes e conjuntas entre as organizações, Igrejas e os diversos setores dos governos, para não só assegurar os direitos, mas também para permitir que essa gente sofredora volte a ter um lar, uma vida digna. As políticas públicas devem se voltar para a reintegração à rede familiar e à sociedade. É exatamente isso que prevê o decreto nº 7.053 de 2009 que ainda não foi implantado na maioria dos estados. Que eles sejam reconhecidos como sujeitos de direitos e tenham condições de desenvolvimento social pleno, como também prega o Artigo 6º da Constituição Federal: "São direitos sociais: a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados."

Participo de ações ligadas à população em situação de rua e confesso que, depois de tantos anos, não vejo muitas mudanças por parte do "poder maior". Enquanto isso não acontece, estaremos lutando, fazendo algo mais, com coragem e esperança. Como disse Nelson Mandela: "Devemos promover a coragem onde há medo, promover o  acordo onde existe conflito e inspirar esperança onde existe desespero". Queremos teto sobre todas as cabeças; queremos alimento em todas as mesas; queremos passar pelas calçadas sem a sensação de estarmos pisando na cama de um irmão; queremos oportunidades para que esse povo possa viver como precisa.